Esse post contém spoilers!
Se existe uma coisa que me incomoda muito na maioria dos animes do gênero yaoi, é como a falta de consentimento está quase sempre presente. Ainda que seja um pouco que deixa a maioria das pessoas desconfortáveis (eu, inclusive), é difícil fugir desses tópicos quando gostamos de animes do gênero. Papa Datte Shitai não é diferente, mas isso não significa que não exista luz no fim do túnel; e por isso eu decidi fazer uma pequena comparação entre o anime e o mangá para explicar para vocês como essa história consegue se redimir (ou não).
Para deixar mais claro como esse anime/mangá passa de problemático a uma história que deixa o coração quentinho, vou explicar do que de fato ela trata.
Kouya Asumi é um estudante universitário que trabalha meio-período como cuidador. Ele começa a trabalhar para um pai solteiro, Keiichi Naruse, que tem um filho pequeno chamado Ichika. Asumi é muito prendado com os afazeres domésticos e parece agradar bastante o novo patrão e também a seu filho, que logo se apega ao rapaz. Acontece que algo na maneira em como Naruse se porta acaba atraindo um desejo incontrolável em Asumi e o rapaz acaba passando dos limites algumas vezes. E é aí que a história fica bem desconfortável.

Como Asumi assume uma postura um tanto selvagem quanto aos sua atração por Naruse, o estudante deixa toda a sua racionalidade de lado e passa pensar apenas com a cabeça de baixo e isso vai contra toda a ideia de uma relação saudável e exemplar, não é meus caros leitores?
Muitas vezes, tanto no mangá quanto no anime, vemos Naruse dizer não para Asumi. Ainda assim o rapaz ignora e prossegue com a ação, fazendo Naruse desejar demiti-lo de sua função, mas o fato de Ichika ter se apegado tão rapidamente a Asumi o faz com que mantenha o estudante com o cuidador de sua casa.

Por conseguir manter o emprego, Asumi passa a descobrir mais sobre a vida de Naruse e até ouve rumores que as mães dos alunos da escola de Ichika espalham sobre o homem. Tais rumores o levam a acreditar que esse seja o motivo pelo qual Naruse se mostra tão distante e tenta evitar ao máximo qualquer relação com ele, mas em um momento de fúria ele chega a cogitar que eles sejam verdade e que o homem seja mesmo promíscuo.
Quando Asumi assume uma postura distante, Naruse passa a perceber que na verdade tem sentimentos pelo rapaz, mas que não quer envolvê-lo na bagunça que a sua vida sempre foi, uma vez que vê a sua relação como algo anormal e deseja que Asumi tenha a chance de ter uma família normal no futuro. Mas Asumi tem uma ideia diferente sobre a relação dos dois e insiste que não vai mudar de ideia futuramente. Nesse ponto a história dá uma virada e vemos Asumi finalmente assumir o seu erro e esperar que Naruse lhe conceda a permissão para tocá-lo. Assim, ambos iniciam uma relação em que Naruse se apoia em Asumi para o bem dele e de Ichika, enquanto Asumi dá o melhor de si para livrar seu amado dos fardos que ele tem de enfrentar por criar o filho sozinho.

Essa mudança em ambos os personagens acaba os levando a uma relação bem mais saudável do que a do início da história, mas isso não chega a ser bem explorado no anime, mas sim no mangá. Na publicação podemos entender todos os medos de Naruse e os traumas que ele carrega consigo mesmo depois da separação da mãe de Ichika e a sua relação com seus pais. Naruse é finalmente capaz de enfrentar seus problemas de frente com mais confiança, fazendo com que ele não tema o que o futuro possa oferecer.
Tudo isso torna a vida de Asumi, Naruse e Ichika mais leve, e os três podem ser a família feliz que eles tanto queriam ser, nos trazendo muitos momentos doces de deixar o coração quentinho, que me fizeram esquecer (ou quase) de como o relacionamento deles começou de maneira problemática.

Mas por que eu decidi falar justo desta história?
Fica difícil entender porque as pessoas romantizam relacionamentos tóxicos, mas é quase impossível fugir quando quase a maioria dos romances que encontramos por aí apresentam esse tipo de relação. É compreensível que a maioria das pessoas não enxerguem ou não entendam aonde mora o problema, mas basta observar com atenção que percebemos o quanto normalizamos certos comportamentos que deveriam ser abominados, e por isso vale a reflexão. Posso contar nos dedos quantos romances – mesmo que não sejam do gênero yaoi – que conseguiram trazer um desenvolvimento saudável de uma relação, o que contribuí e muito para a normalização de certos padrões. É realmente importante que um romance foque mais nos aspectos sexuais de um relacionamento do que em desenvolver a história e a conexão dos personagens de maneira saudável?
